
Justiça reconhece que a colheita e os frutos da pequena propriedade equivalem à remuneração do produtor e podem ser penhorados, desde que não comprometam a subsistência da família
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a produção agrícola e avícola de uma pequena propriedade rural pode ser penhorada, desde que a medida não comprometa o sustento do devedor e de sua família. O entendimento busca equilibrar os direitos do credor e a função social da terra, reconhecendo que, embora a Constituição Federal garanta a impenhorabilidade da propriedade rural familiar, essa proteção não se estende automaticamente aos frutos e rendimentos.
A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Especial nº 2.177.389, relatado pela ministra Nancy Andrighi. O caso teve origem em uma execução de título judicial no Paraná, em que o credor, sem encontrar outros bens penhoráveis, solicitou a penhora de parte da produção agrícola e avícola do devedor.
Em primeira instância, a Justiça havia autorizado a penhora limitada a 30% da produção. No entanto, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) reformou a decisão, afirmando que a impenhorabilidade constitucional da pequena propriedade rural também se estenderia aos seus frutos e rendimentos.
Ao recorrer ao STJ, o credor alegou que não existe previsão legal que impeça expressamente a penhora da produção e que essa seria a única alternativa para garantir o cumprimento da dívida.
Base legal: artigos 833 e 834 do Código de Processo Civil
A ministra Nancy Andrighi afirmou que não há lei que estenda a impenhorabilidade da propriedade aos seus frutos. Assim, aplica-se o artigo 834 do CPC, que permite a penhora dos frutos e rendimentos de bens inalienáveis, desde que não existam outros bens disponíveis.
Além disso, a relatora explicou que a produção rural se enquadra como remuneração do trabalhador autônomo, conforme o artigo 833, inciso IV, do CPC, que proíbe a penhora total dos ganhos de trabalho, mas admite a penhora parcial, desde que preservado o mínimo necessário à subsistência.
“A penhora indiscriminada da produção do pequeno produtor rural desvirtua a função social da propriedade, que é garantir a segurança alimentar e a dignidade da família que nela trabalha”, destacou a ministra.
Penhora deve respeitar o mínimo existencial
De acordo com a relatora, a produção de pequenas propriedades rurais raramente gera excedente suficiente para permitir penhora sem prejuízo. Mesmo a venda de parte da colheita costuma ser essencial para o sustento familiar, aquisição de alimentos e insumos básicos.
Por isso, o STJ adotou a mesma lógica aplicada à penhora de salários, permitindo a medida apenas quando comprovado que não afetará o mínimo existencial.
Com essa decisão, o caso retornará ao TJ-PR, que deverá analisar se a penhora requerida pelo credor pode ser realizada sem comprometer a sobrevivência do pequeno produtor e de sua família.
Decisão reforça equilíbrio entre proteção e execução
O entendimento do STJ abre precedente para outros casos semelhantes, ao mesmo tempo em que preserva a função social da terra e garante o direito dos credores. A decisão reforça a necessidade de análise individualizada de cada situação, evitando tanto a inviabilização da atividade rural familiar quanto a impunidade de dívidas legítimas.
A medida reflete a busca por equilíbrio entre justiça social e efetividade da execução, um desafio constante no campo do direito civil e processual.
Processo: REsp 2.177.389
Relatora: Ministra Nancy Andrighi
Data do julgamento: 1º de outubro de 2025
Fonte: Superior Tribunal de Justiça (STJ) / Revista Consultor Jurídico (ConJur) / Agência Brasil
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