Reforma tributária: o que muda na vida do produtor rural em 2026?

As mudanças da Reforma Tributária em implementação impactam diretamente o agronegócio, um dos pilares da economia brasileira.

Por Mariana Patricia* – Estamos a poucos dias de 2026 e o cenário tributário está passando por mudanças profundas. A regulamentação da Reforma Tributária está avançando, novas regras de obrigações acessórias estão sendo implementadas e a Reforma do Imposto de Renda segue para sanção presidencial. Diante disso, surge a pergunta: o que o produtor rural pode realmente esperar no próximo ano e como deve se preparar?

As mudanças que estão sendo implementadas afetam diretamente o setor do agronegócio, um dos mais importantes para a economia brasileira. Embora a promessa seja de simplificação do sistema, as novas regras também trazem desafios importantes para produtores e empresários do setor. Na prática, o produtor rural deve se preparar para um aumento real da carga tributária e para a necessidade de adaptação aos novos modelos de emissão, controle e apuração de tributos.

Como Funciona a Tributação Atual?

Atualmente, os principais tributos que incidem sobre o agronegócio são: ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços); IRPF (Imposto de Renda da Pessoa Física); ITR (Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural), e as contribuições ao SENAR, salário-educação e FUNRURAL; e no caso dos produtores rurais que atuam como pessoa jurídica, há o IRPJ (Imposto de Renda da Pessoa Jurídica), CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), PIS e Cofins (Programa de Integração Social e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social).

Considerando que mais de 90% dos produtores rurais exploram suas atividades na pessoa física, atualmente, as maiores preocupações tributárias desses produtores são o Imposto de Renda e o ITR, ambos são obrigações anuais. No imposto de renda, o produtor rural pessoa física, tem a opção de duas opções de apuração: uma sujeita à alíquota progressiva de até 27,5%, e outra com alíquota efetiva de 5,5%, que não permite a dedução das despesas da atividade.

Já em relação aos tributos sobre o consumo ICMS, PIS, Cofins, ISS e IPI, atualmente não representam um grande desafio para os produtores rurais. Isso se deve aos incentivos fiscais que diferem/postergam, reduzem ou zeram suas alíquotas, importantes para compensar o alto risco da produção agropecuária e garantir o abastecimento de alimentos no país.

Embora a tributação sobre o consumo não tenha sido uma grande preocupação para o produtor rural até o momento, a Reforma Tributária muda esse cenário. As novas regras aumentarão a complexidade e a carga tributária, exigindo atenção redobrada dos produtores rurais e empresários do setor.

Além disso, outro ponto de atenção é a Reforma do Imposto de Renda, que traz mudanças nas regras da tributação de lucros e dividendos recebidos por pessoas físicas. O texto da Reforma, prevê a tributação das altas rendas que impactará diretamente o produtor rural.

Diante dessas mudanças, é importante entender o que vai mudar em cada uma dessas reformas e como o produtor rural e empresário podem se preparar para reduzir os riscos e impactos no seu negócio.

Reforma do Imposto de Renda: principais alterações

Primeiramente, o PLP 1.087/2025, que aguarda sanção presidencial, traz algumas mudanças na tributação da renda. O texto aprovado estabelece um novo modelo de tributação com quatro principais mudanças:

  • Isenção para quem recebe até R$ 5 mil por mês;
  • Redução gradual das alíquotas para rendas entre R$ 5 mil e R$ 7.350 mensais;
  • Tributação mínima obrigatória para quem tiver renda anual acima de R$ 600 mil;
  • Cobrança de 10% sobre lucros e dividendos que ultrapassarem R$ 50 mil por mês, inclusive quando enviados ao exterior.

Mas, o que muda para o produtor rural?

A partir de 2026, o produtor rural que tiver rendimentos acima de R$ 600 mil por ano poderá pagar até 10% a mais de imposto. Vale lembrar que esse imposto complementar será pago apenas em 2027, referente aos rendimentos do ano-calendário de 2026. Na prática, o Fisco vai somar todos os rendimentos, inclusive os da atividade rural, permitir algumas deduções e, se o valor ultrapassar esse limite, cobrar a diferença. Esse valor será um complemento ao que o produtor já paga: além da alíquota máxima de 27,5%, quem ultrapassar o limite poderá ter um adicional de até 10%. Essa mudança irá mudar a regra do jogo para o produtor rural.

O texto também prevê que outras fontes que não entram nessa conta dos R$ 600 mil anuais. É o caso das aplicações financeiras do agro, como as Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs), os Certificados de Depósito Agropecuário (CDAs) e os rendimentos do Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro).

O que muda com a Reforma Tributária (sobre o consumo)?

Essa reforma foca na tributação sobre o consumo, alterando tributos como ICMS, PIS, Cofins, ISS e IPI. Além disso, outros impostos como o ITCMD (transmissão causa mortis e doação) e o IPVA também sofreram mudanças.

A principal alteração será a substituição de cinco tributos sobre o consumo (ICMS, ISS, PIS, Cofins e IPI) pelo modelo de Imposto sobre Valor Agregado (IVA Dual), composto por:

  • CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), administrado pela União;
  • IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), gerido por Estados, Distrito Federal e Municípios.

Além disso, será introduzido o Imposto Seletivo (IS), que incidirá sobre produtos prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

Como ponto de partida, é certo que o produtor rural (física e jurídica) não será contribuinte do IBS/CBS, quando auferir receita bruta inferior a R$ 3,6 milhões no ano-calendário ou quando for integrado. Caso excedam esse limite de receita anual, passarão a ser contribuintes da CBS (federal) e do IBS (estadual e municipal) a partir do segundo mês subsequente.

A Lei Complementar também prevê, para os produtos agropecuários, uma redução de 60% sobre a alíquota padrão do IBS e da CBS. Contudo, ainda não há definição concreta quanto ao percentual total da alíquota cheia, a ser definida por lei ordinária dos entes federados. Especula-se que esse valor gire em torno de 28,5%, o que resultaria, para os produtos agropecuários não incluídos na cesta básica, em uma alíquota efetiva aproximada de 11,4%.

Outra alteração significativa é a extensão das contribuições aos fundos estaduais, como o FUNDERSUL no Mato Grosso do Sul, que poderá ser cobrado até 2043. Isso representa um aumento na carga tributária para os produtores rurais.

A Reforma Tributária altera o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação), introduzindo alíquotas progressivas obrigatórias entre 8% e 16%. Essa mudança impactará diretamente a transmissão de patrimônio, já que atualmente alguns estados aplicam alíquotas fixas e mais baixas para o imposto. Por exemplo, uma fazenda avaliada em R$ 6 milhões, ao ser doada com uma alíquota de 8%, poderá gerar um imposto de aproximadamente R$ 480.000,00, dificultando a transferência de patrimônio entre gerações. Isso pode resultar em uma perda significativa do patrimônio familiar, impactando diretamente na sucessão e a continuidade do negócio rural.

A Reforma Tributária vai mudar regras importantes que afetam diretamente o produtor rural, desde a produção agropecuária até a transmissão de patrimônio. Para lidar com esses impactos, evitar problemas e o aumento de custos é fundamental contar com orientação especializada, que ajude a entender as mudanças, planejar e garantir que a atividade rural continue rentável e competitiva.

Como vai ficar para o produtor rural?

A partir de 2026, os produtores com faturamento anual de até R$ 3,6 milhões poderão optar por serem contribuintes do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviço), sem grandes alterações, mas o produtor sentirá aumento nos custos, já que toda a cadeia será mais tributada. Já aqueles com faturamento superior serão obrigados a aderir tanto ao IBS quanto à CBS, com novas obrigações fiscais, como declarações mensais e controle contábil mais rigoroso.

A estimativa é que a carga tributária total para o setor agropecuário passe de 4,5% para mais de 11%, triplicando os impostos pagos. Isso afetará diretamente os custos de produção e os preços dos alimentos.

Com a Reforma Tributária sobre o consumo, os novos tributos atingirão todas as operações da cadeia do agronegócio, trazendo um impacto real ao produtor rural, que terá que pagar o imposto no momento da venda do seu produto. Por exemplo, um agricultor que explora lavoura de soja, se ele tem um faturamento acima de R$ 4 milhões de reais ao ano, obrigatoriamente será contribuinte do IBS e CBS, ao vender sua soja terá que recolher esses impostos em uma alíquota estimada em 11,4%, além de enfrentar aumento no custo de produção, já que os insumos também passarão a ter uma carga fiscal maior.

Outro ponto que merece grande atenção e talvez o maior impacto para o produtor rural é o fluxo de caixa. A lei prevê que o produtor poderá aproveitar créditos dos tributos pagos na compra de insumos. Ou seja, ele compra insumos com um imposto, mas só poderá recuperar esse crédito quando vender a produção. No agronegócio, onde há forte sazonalidade, isso representa um grande problema. Um produtor de soja, por exemplo, compra insumos no início do ano, planta meses depois, colhe no ano seguinte e só então vende. Durante todo esse período, o valor pago de tributo nos insumos ficará “parado” na contabilidade, sem possibilidade de compensação imediata.

É importante destacar que, com a Reforma Tributária, o pequeno produtor rural vai sentir o aumento nos custos na compra de insumos, devido ao aumento da carga tributária em toda a cadeia do agronegócio, isto representa, uma alta no custo de produção, deixando mais difícil competir no mercado e, resultando, no aumento dos preços para o consumidor final.

Além da alta tributação, o produtor terá que lidar com maior complexidade fiscal. A partir de janeiro inicia-se o período de transição, em que o modelo atual conviverá com o novo sistema até 2033. Isso significa que, por vários anos, o produtor rural terá que acompanhar dois sistemas tributários ao mesmo tempo, exigindo organização e planejamento.

É importante dizer que essa reforma não altera tributos como o Imposto de Renda, o FUNRURAL, o ITR, a Contribuição ao Salário-Educação, o SENAR e outros encargos específicos do setor. Ou seja, o produtor rural continuará com a responsabilidade de pagar esses tributos, além dos novos ajustes que a reforma tributária exige.

Diante de tantas mudanças, o cenário tributário realmente muda a regra do jogo. O produtor rural precisa começar a olhar com mais atenção para a parte fiscal da fazenda e planejar os próximos passos da atividade.

Nesse momento, torna-se essencial avaliar alternativas mais estratégicas, como a constituição de uma pessoa jurídica (CNPJ) ou a organização da exploração rural entre os membros da família na pessoa física, equilibrando despesas e receitas entre os CPFs. Em muitos casos, é possível estruturar um modelo que reduza a carga tributária, organize o fluxo financeiro e separe o patrimônio pessoal do patrimônio da atividade rural, trazendo mais segurança e eficiência para a gestão.

Além dos ganhos tributários, estruturar o negócio rural também facilita o acesso a crédito, melhora o planejamento sucessório e fortalece a governança familiar, fatores cada vez mais importantes para garantir a continuidade e o crescimento das fazendas.
A partir de 1º de janeiro, a Reforma Tributária começará a ser implementada, em um processo gradual que vai até 2033. Nesse primeiro momento, o foco do produtor rural deve estar na adequação da nota fiscal digital ao novo modelo, sob pena de ter a nota recusada e, consequentemente, perder recursos e comprometer o fluxo de caixa.

O ano de 2026 trará mudanças significativas para todo o agronegócio, com aumento da carga tributária e maior complexidade na gestão fiscal. Embora essas novas regras representem desafios, como o encarecimento dos insumos, a elevação dos custos de produção e novas obrigações acessórias, também trazem a oportunidade de organizar melhor o negócio, melhorar a eficiência e manter a fazenda lucrativa mesmo diante das mudanças.

O que fazer agora: Um checklist essencial para os produtores rurais

  • Analise seu faturamento atual e projetado para os próximos anos, identificando se você será enquadrado como contribuinte do IBS/CBS.
  • Verifique se os insumos utilizados na atividade estão listados no anexo da Reforma, garantindo o direito à apropriação de créditos.
  • Realize um diagnóstico tributário ainda em 2025 para avaliar qual regime é mais adequado ao seu perfil.
  • Reavalie estratégias de planejamento sucessório e estruturas familiares, como holdings, à luz das novas regras.
  • Prepare-se para as novas obrigações acessórias, especialmente a emissão de notas fiscais e declarações no novo modelo.

É fundamental que o produtor rural se antecipe às mudanças, entendendo as novas exigências fiscais e ajustando a gestão da fazenda para evitar custos inesperados. A adequação ao novo sistema, aliada a um bom planejamento tributário e sucessório, permitirá minimizar impactos, manter a competitividade e reduzir custos ao longo da cadeia.

Com preparação adequada e orientação jurídica especializada, o produtor rural estará mais seguro para enfrentar os desafios tributários dos próximos anos, garantindo continuidade, proteção patrimonial e lucratividade para o seu negócio rural.

Mariana Patricia. Advogada. Especialista em Direito do Agronegócio e em Tributação no Agronegócio. Sócia Fundadora do escritório Mariana Patricia Advocacia. Membra da Comissão do Agronegócio OAB/MS.

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